O debate sobre a regulamentação da Inteligência Artificial no mundo voltou a dar passos importantes na última semana, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou no âmbito da Assembleia Geral uma nova resolução sobre governança da IA. A partir dessa aprovação, tanto a ONU como especialistas em direito digital reforçam defendem ser crucial que cada país tenha condições de adequar seus marcos legais às suas realidades sociais, políticas e econômicas, evitando encobrir suas demandas por orientações de forças externas.
Durante debate sobre o tema no Security Leaders Brasília, a Sócia Fundadora do escritório Peck Advogados, Patrícia Peck, apontou essa necessidade, reforçando que o Brasil precisa ser cauteloso ao aproximar sua regulação interna ao AI Act, estabelecido no contexto da União Europeia. Segundo ela, o Projeto de Lei 2338/23 já abre espaço adequado para os brasileiros discutirem a segurança e a inovação da tecnologia à sua própria realidade.
“Particularmente, não concordo com diversos pontos do AI Act, e penso que o Brasil tem um poder real de construir leis adequadas às diversidades sociais. O país deveria estar ocupando um papel de liderança nessa discussão, pois temos especialistas, dados e conhecimento suficientes para desenvolver uma das melhores leis de controle da tecnologia no mundo, sem precisar importar demais do exterior”, afirmou Patrícia.
Apesar desse novo ponto de vista, a tendência é que a Lei da IA no Brasil aproxime seus entendimentos da proposta europeia, tal qual informou a diretora da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, Miriam Wimmer, no “Diálogo Bilateral União Europeia-Brasil sobre Economia Digital”, workshop organizado pelo Ministério das Relações Exteriores e com a presença de deputados europeus ligados ao tema.
“Especialmente no que tange à Inteligência Artificial, há um campo fértil para compartilhamento de percepções, pois a União Europeia acaba de aprovar o AI Act, cuja discussão tem também influenciado os debates no Congresso brasileiro”, comentou Miriam.
Resolução da ONU
O documento das Nações Unidas foi aprovado por todos os 193 membros do órgão e tem o objetivo de promover o desenvolvimento seguro da tecnologia, apesar das realidades heterogêneas dos países. Segundo a embaixadora dos Estados Unidos e autora principal da resolução, Linda Thomas-Greenfield, o grande valor dessa nova decisão está em alinhar vozes dissonantes de inovação em torno de um tema bastante complexo.
“Hoje, todos os 193 membros da Assembleia Geral das Nações Unidas falaram em uma só voz e, juntos, decidiram governar a Inteligência Artificial em vez de deixá-la nos governar. Esta resolução reconhece que os riscos e benefícios da IA tem potencial de afetar a todos, e por isso, estabelece responsabilidades compartilhadas na criação de bases para a tecnologia não deixar ninguém no caminho”, afirmou Linda após a aprovação do documento.
Entre as definições da resolução, considera-se necessário reduzir as lacunas digitais entre os países e dentro deles, para todos poderem se beneficiar da nova tecnologia e evitar que potências tecnológicas abusem do poder da IA visando expor a comunidade internacional em desenvolvimento a riscos, prejudicando a paz e reprimindo direitos humanos.
O avanço da ONU se junta a outras ações públicas direcionadas à regulamentação da IA em todo o mundo, como o AI Act. O arcabouço, aprovado por 523 votos no Parlamento Europeu, propõe limites no desenvolvimento da tecnologia em favor dos direitos fundamentais dos indivíduos, da democracia e do estado de direito, em equilíbrio com o incentivo à inovação.
*Com informações da ONU e da Agência Reuters