Existe hoje no mercado de Segurança da Informação uma crescente escassez de profissionais para atuarem no setor. Segundo os resultados recentes do (ISC)² Cybersecurity Workforce Study de 2018, são 2,9 milhões de vagas não preenchidas. As mulheres ainda são minoria nesse universo e representam hoje apenas 24% da força de trabalho. Mas ao que tudo indica, o cenário está mudando. Pela primeira vez, o Congresso Nacional Security Leaders reuniu um time de cinco líderes para falar da presença feminina na SI e das boas práticas que ajudaram a transformar suas histórias em cases de sucesso.
Quando Fernanda Vaqueiro, atual CSO da Oi, entrou para a empresa em 2007, ela tinha apenas um time de quatro pessoas à disposição. Sua missão era construir uma equipe de segurança. Ao se tornar gerente da área um ano depois, deu início à consolidação da SI na empresa. Criou um SOC interno e em 2010 formou o primeiro grupo de Ethical Hacking. A partir de 2012, começaram a trabalhar em grandes eventos, como Copa do Mundo, Copa das Confederações, JMJ, entre outros. “Depois mostramos que a Segurança é um serviço de valor agregado e conseguimos transformá-la em modelo de negócio, ou seja, a SI deixou de ser fonte de custo para ser fonte de receita”, disse.
Larissa Escobar, Cybersecurity and Business Continuity Management da AES Eletropaulo, fez seus projetos serem adotados pelas outras áreas da organização e se tornarem referência posteriormente. “Isso só foi possível porque conseguimos negociar e mostrar a todos a importância de implementar os controles de cibersegurança na empresa”. Segundo a executiva, essa capacidade de negociação foi imprescindível para que os demais departamentos vissem a segurança de maneira diferente, até mesmo por aquelas tidas como mais resistentes. Além disso, “fazer com que os colaboradores participem ativamente e saibam como a contribuição deles é importante para um projeto bem-sucedido foi fundamental”.
Atuando pela primeira vez no segmento varejista, Márcia Tosta, gerente de SI do Grupo Boticário, chegou na companhia com a missão de estruturar e consolidar a área de Segurança. Um dos desafios era implementar processos sem travar o crescimento da empresa, que via a área de SI como o “glóbulo branco da inovação”. Desde que passou a fazer parte do time, a estratégia foi desenvolver diversas atividades de conscientização para engajar e estimular os colaboradores a se tornarem mais conscientes.
As campanhas eram feitas para todos os colaboradores, enquanto as ações mais voltadas para os times de TI. A prática era levar palestrantes parceiros para tratar de assuntos voltados para a Segurança, principalmente para a importância de senhas fortes. Outras atividades também foram desenvolvidas, como uma live, em que as pessoas tiravam dúvidas ao vivo com profissionais da área, e um e-learning também dedicado às boas práticas de SI. “No mês do desenvolvimento, percorremos seis sites para abordar o tema. O desafio era trazer atos que não fossem mais do mesmo. As ações foram tão bem-vindas que o Grupo reconheceu e incluiu no calendário anual da companhia. Agora em novembro começamos uma nova etapa, mais voltada para as difundir as políticas de segurança”, comemorou.
Entre as principais conquistas que Cássia Carmonário, gerente de SI do Carrefour, conseguiu na instituição foi com que todas as áreas passassem a considerar a Segurança no início dos seus projetos. O segredo: compreender o dinamismo do Varejo e entender que não poderia frear a agilidade do setor. “Em vez de ficar mostrar o certo e o errado fizemos com que todos avaliassem os riscos. Todo mundo tem que conhecer e trabalhar nisso juntos”, disse. Recém-chegada do setor industrial, conhecido pela maturidade em segurança, Cássia afirmou que teve de mudar o mindset pessoal e não adotar uma postura de imposição. Hoje a Segurança deixou de ser uma área isolada e todos consultam o setor antes de dar um passo adiante.
Já Cibele Fonseca, Head of IT da Assessor Bordin, sempre se apoiou nos estudos para se destacar profissionalmente e conquistar cargos mais desafiadores. Logo descobriu que quanto mais estudava e obtinha conhecimento, mais fácil era para se posicionar. Percebeu cedo que o Direito seria crucial no futuro ao considerar o contexto de transformação digital, e não hesitou em se graduar. Além do estudo, Cibele compreende os perfis de seus colaboradores antes de atribuir tarefas. Pautada por metodologia e processos, ela acredita que a melhor forma de ser bem-sucedida é mostrando resultados. “Na hora dos indicadores não tem essa distinção de gênero. É a competência que vale”, explicou.
Diversidade e multidisciplinaridade
Segundo as painelistas, um dos principais desafios da área é a dificuldade de interação e networking, já que o ambiente é predominantemente masculino. “Muitas parcerias, trocas de informações ainda são feitos em um universo masculino, então, é muito difícil pra gente conseguir furar esse clube do bolinha”, explicou Marcia Tosta. Os grupos em aplicativos de troca de mensagens acabaram se tornando uma saída em muitos casos. “Mesmo assim, sou a única mulher num grupo de 25 homens”.
Fernanda Vaqueiro também participa de algumas discussões mas afirma que já há com ela outras mulheres, apesar do número reduzido. Fernanda atribui isso a formação de poucas mulheres no setor. “Há poucas pessoas se dedicando, talvez por não conhecerem tanto como funciona a área. No entanto, tem oportunidades para vários perfis de mulheres”, disse.
De fato, a percepção da executiva da Oi coincide com um levantamento realizado pela Serasa Experian, em parceria com a ONU Mulheres, onde é revelado que as mulheres são minoria nos cursos de Ciências e Tecnologia nas faculdades e correspondem a apenas 17% do total de programadores. Outro estudo da Harvard Business Review mostra que 41% das mulheres atuantes na área de Tecnologia desistem de suas carreiras, contra apenas 17% dos homens.
Mesmo diante desse desequilíbrio entre homens e mulheres no universo de TI e SI, elas afirmam que não fazem distinção de gênero na hora da contratação. “Não contrato gênero, mas habilidade e competência”, disse Fernanda. “Acho muito saudável para uma equipe ter habilidades diferentes, já que homens e mulheres têm capacidades distintas, mas complementares. São olhares variados. No meu time são mais de 200 colaboradores indiretos e cerca de dez mulheres. É um porcentual pequeno, mas porque o mercado ainda não tem essa quantidade de profissionais disponíveis”.
Diferenças salariais também foi outro ponto debatido. Apesar de todas afirmarem que não se sentem discriminadas em relação a salários e recompensas, Cibele disse já ter enfrentado esse tipo de situação no passado. “Há cerca de dez anos, gerentes na mesma posição que eu tinham salários mais altos que o meu”, disse. Atualmente, todas concordam que o cenário está mudando e os profissionais, independente de gênero, estão sendo avaliados de acordo com o currículo.
Para finalizar, as painelistas foram desafiadas a dizer por onde mudariam a Segurança se tivessem que escolher apenas um dos tripés. Sem hesitar, todas concordaram que começariam pelas pessoas. “São elas quem vão transformar os processos para comprar as tecnologias de forma correta”, resumiu Fernanda.