O Global Mules Report 2024, estudo divulgado pela empresa de segurança digital BioCatch, revelou que em meio ao crescimento avassalador da economia paralela do crime organizado, o sistema financeiro brasileiro enfrenta um dos seus maiores desafios: o uso desenfreado de contas laranjas. Segundo os dados, essas contas são abertas e usadas por terceiros com o intuito de ocultar a origem de valores ilícitos.
Os dados levantaram que mais de US$ 3,1 trilhões circularam em dinheiro ilegal pelo sistema financeiro global no último ano. Uma parte importante dessa cifra passou pelas quase 2 milhões de contas laranjas identificadas em 257 instituições financeiras de 21 países.
No Brasil, a fragilidade da legislação penal aliada à ausência de mecanismos eficazes de responsabilização tornou o uso dessas contas uma estratégia de baixo risco e alto retorno para criminosos, apontou a pesquisa. Enquanto nos Estados Unidos a pena média por lavagem de dinheiro gira em torno de 71 meses de prisão, e pode chegar a 14 anos no Reino Unido ou até prisão perpétua na Austrália.
Dados reforçam dimensão do problema
Dados do relatório 2024 Digital Banking Fraud Trends in Brazil, da BioCatch, reforçaram a vulnerabilidade do ambiente digital: 90% das fraudes ocorrem em dispositivos móveis, e mais de 70% das perdas financeiras em 2022 foram via Pix. No total, os golpes resultaram em um prejuízo de US$ 500 milhões no Brasil.
Além disso, a percepção de segurança caiu sete pontos percentuais entre 2023 e 2024, enquanto a expectativa sobre a responsabilidade das empresas aumentou: 86% dos entrevistados acreditam que as companhias devem garantir a proteção dos dados de seus clientes.
Contas laranjas
A organização aponta como contas fundamentais ao funcionamento da economia informal, já que operam como estruturas de dissociação entre o crime e o dinheiro, permitindo que quantias bilionárias transitem por caminhos digitais quase invisíveis. O relatório revelou que cerca de 70% delas são alugadas com ciência ou participação do titular.
Os outros 30% são resultados de fraudes de identidade, com CPFs e dados pessoais utilizados por quadrilhas especializadas. Estima-se que mais de 1,6 milhão de brasileiros tenham “emprestado” seus dados para outra pessoa movimentar dinheiro em seu nome.
Responsabilização institucional
A BioCatch apontou que há uma fragilidade do sistema bancário brasileiro no enfrentamento de contas laranjas. Em alguns países, parte do prejuízo com fraudes recai sobre a instituição que recebe os valores, o que força bancos a adotarem sistemas mais robustos de prevenção e controle de contas de passagem.
Outro caminho defendido por especialistas é o compartilhamento de dados entre bancos para aumentar a eficácia e a velocidade na detecção de padrões fraudulentos. Embora essa colaboração já esteja em fase inicial no Brasil, ela ainda é restrita e enfrenta dificuldades operacionais e regulatórias.