Por Lucio Leite
Busca por eficiência operacional, transformação digital e experiência consistente com o cliente e de marca são obrigatórios para quem quer continuar a ser relevante no setor de varejo que, como os demais negócios, teve de se adaptar muito com os impactos gerados pela pandemia do Coronavírus.
Ao longo dos últimos meses, muito tem se falado sobre mudanças no varejo e a necessidade de uma transformação digital. O setor, de uma forma geral, já vinha experimentando transformações a partir da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), “phygital”, meios de pagamento, novas gerações, novos modelos de negócios e toda uma disrupção digital no setor. E, ainda, para adicionar novos desafios, vem uma pandemia para fechar lojas e mudar ainda mais os hábitos de consumo e as relações com as marcas e, consequentemente, com seus consumidores. Estima-se que quase 10.000 lojas fecharam as portas, nos últimos dois anos, somente nos Estados Unidos.
Por outro lado, com a pandemia, foi possível entender quem estava fazendo, e podia fazer, o dever de casa e quem não estava. Aquelas empresas que, antes da COVID-19, já tinham iniciado suas jornadas para o digital, provavelmente são aquelas que vão se sair melhores do que entraram.
O varejo brasileiro entendeu a importância e o papel da tecnologia, como meio, para atender às demandas de negócios. Com isso, vem aprendendo a usar dados estatísticos, coletando informações dos consumidores para acompanhar comportamento e atuais necessidades, a fim de criar métricas de eficiência, produtividade e gestão.
Esse movimento que intensifica a cultura data-driven tem gerado mais riqueza nas informações consolidadas do varejo, a qual revela uma série de insights relevantes para quem quer entender melhor o setor e as tendências que se desenham para os próximos meses.
Quer ser eficiente? Olhe para os supermercados
O ranking IBEVAR-FIA 2020, em sua primeira versão on-line, não se limitou a apresentar as 120 maiores redes varejistas do País em tamanho, mas também trouxe os rankings de eficiência e imagem, além das mais admiradas. No quesito eficiência, o estudo avaliou aspectos como produção, número de lojas e número de colaboradores. O setor de supermercados se destaca fortemente: este ano nove redes do setor atingiram nota máxima (Carrefour, Makro, Zaffari, Irmãos Boa, Atakarejo, Formosa, Roldão, Irmãos Muffato e D’Avó).
As redes de supermercados também se destacam quando o tema é a produtividade por loja, sendo que das 15 empresas líderes em faturamento por loja, 13 são supermercadistas, o que também se explica pelo volume de vendas. Ao analizarmos o faturamento das 120 empresas listadas no Ranking IBEVAR (R$527 bilhões), três supermecadistas estão entre as cinco maiores empresas, enquanto a soma de todos os supermercados nesta lista representa 52% (R$275 bilhões).
Transformação digital: acelerada
Os consumidores se movimentam mais rapidamente que as empresas quando o assunto é o digital. Porém, durante a NRF 2021, Michelle Evans, Senior Head of Digital Consumer, da Euromonitor International, trouxe uma visão mais holística sobre a adoção de tecnologia no varejo. A COVID-19 acelerou a transformação digital de todos os setores, e no varejo isso não foi diferente, pois todo o plano de digitalização também foi agilizado em pelo menos dois a três anos.
Segundo um artigo do Google, no canal “ThinkwithGoogle”, um dos grandes impactos da pandemia no varejo foi a aceleração digital. O artigo traz, também, um dado relevante: 13% dos brasileiros compraram de uma loja via smartphone pela primeira vez, e 11% experimentaram comprar online e retirar na loja. O Mercado Livre registrou, na América Latina, mais de 22 milhões de novos usuários.
A jornada de compra dos consumidores é omnichannel, e a digitalização dos negócios é uma tendência inevitável. A integração de estoques e o uso das lojas como parte do processo logístico criam novos desafios, mas atendem às demandas dos consumidores. Redesenhar a malha logística e fazer das lojas verdadeiros hubs logísticos, porém, depende do uso intensivo de tecnologia nas interações com os clientes.
Diantes dos desafios foi preciso quebrar paradigmas e uma rápida adaptação por parte dos varejistas para entender o consumidor. Nos meios de pagamento, as carteiras digitais, por exemplo, aparecem como importante ponto de interação sem atrito. Estudos mostram que a pandemia acelerou a migração para as chamadas “eWallets”, tornando uma tendência, mesmo em cenários futuros, sem distanciamento social. No Brasil, 40% da população já faz uso das carteiras digitais – um percentual ainda modesto quando comparado com outros países.
Outro aspecto relevante é a construção de marketplaces e ecossistemas de negócios. De acordo com a Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABCOMM), o e-commerce viu um crescimento de 68% em 2020, atingindo R$126,3 bilhões, tornando os marketplaces importantes ferramentas de negócios para os pequenos empreendedores no País. Ainda de acordo com a ABCOMM, essa modalidade já representa 78% de participação do e-commerce. Destaque para o Mercado Livre que recebeu 279,5 milhões de acesso no mês de março de 2021 e percebeu um crescimento de 23% (ano a ano). Vale destacar ainda a presença da AliExpress vendendo para o mercado brasileiro, tendo registrado no mês de março deste ano 41 milhões de acessos no Brasil.
Digitalização que constrói reputação
O terceiro aspecto avaliado pelo IBEVAR em seu ranking (além do faturamento e da eficiência) foi a imagem das empresas de varejo, a partir da opinião dos consumidores. Após a análise das manifestações dos consumidores nas redes sociais, foram definidas as empresas com melhor avaliação dos clientes em 17 categorias.
Existe uma correlação entre a avaliação positiva das empresas pelos consumidores e o valor das marcas. A edição 2020 do relatório da Brand Finance é dominado por empresas do setor financeiro, mas a lista das varejistas entre as marcas mais valiosas do País guarda uma boa relação com a listagem do IBEVAR. A conclusão? A experiência positiva oferecida pelas empresas agrega valor, melhora a imagem, amplia as vendas e valoriza suas marcas.
As empresas só se justificam no mercado se tiverem um posicionamento que esteja baseado em valores claramente identificáveis pelos consumidores. E, cada vez mais, esses valores se traduzem em uma experiência memorável para o cliente. Uma experiência que proporcione uma compra rápida, a um preço justo e disponibilize os produtos que o cliente deseja. Some-se a isso, com o aumento do e-commerce e a entrada em vigor da LGPD, garantir a segurança das transações é fundamental e é a base para uma relação de confiança com a marca. Para que isso seja possível, o varejo precisa acelerar sua transformação digital, mudar sua cultura e ganhar eficiência e produtividade.
Por fim, além de posicionar o cliente no centro dos negócios, é preciso colocar a tecnologia igualmente no centro da estratégia, pois, de forma positiva ou negativa, as experiências tecnológicas impactam muito mais que qualquer outra interação do consumidor.
*Lucio Leite é Diretor de Transformação Digital & Líder para os Negócios de Varejo da Teltec Solutions, Diretor Institucional do Instituto Brasileiro de Executivos do Varejo (IBEVAR) e Diretor da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (ABCOMM).